13 de set. de 2010

Paulo Guerra: Los padres terribles

Foto: Guilherme Santos
Em casa, estamos todos loucos.

(fala do personagem Miguel – o filho)

A convite da organização do 17º Porto Alegre em Cena fui convidado para assistir e após comentar o espetáculo uruguaio Los padres terribles, de Jean Cocteau, na Sala Carlos Carvalho da C.C.M.Q..

As portas do teatro abrem 15 minutos antes do início, a fila anda e consigo um bom lugar na terceira fila. Começa aquele burburinho maravilhoso que só quem é do teatro sabe o valor que tem. O público conversando, cheio de expectativas, curiosidades... Próximo do início da peça, chama-me a atenção, e a de algumas pessoas próximas, uma conversa (discussão) bem calorosa, na primeira fila, de uma família de quatro integrantes. Pensei: será que já começou? Não é em castelhano? Era uma outra família, que discutia com os filhos sobre as compras dos ingressos para os outros espetáculos. Os pais discordavam das escolhas feitas.

Felizmente, a luz diminui e aos acordes da trilha iniciam pontualmente o espetáculo.

Mesmo prestes a completar 72 anos de sua criação,este texto de Jean Cocteau é extremamente contemporâneo na sua temática.O amor edipiano de uma mãe completamente enlouquecida por seu filho, esse às raias da infantilidade no auge dos seus 22 anos. Um pai preocupado com suas invenções e uma “tia” que manipula tudo e todos . No decorrer dos conflitos, surge a noiva do filho, também surreal.

Surreal como seu autor e por que não dizer do diretor Alberto Zimberg, que é correto em manter o ritmo da encenação e, também, pelo ótimo desempenho do elenco, que joga, com segurança, neste emaranhado universo íntimo familiar, seus segredos inconfessáveis e suas crises de identidade.
O jogo cênico é histriônico e hipnotizante, muitas vezes pelas situações absurdas que as personagens passam. Levam o público a serem cúmplices daquele quarto onde tudo acontece.

Tudo funciona bem, um cenário simples e muito bem solucionado, com a transformação em outro ambiente. O emaranhado de fios e nós que compõem a cabeceira da grande cama nos remete à trajetória distorcida dos relacionamentos. Um figurino também de acordo e elegante com a proposta. Vale ressaltar a trilha sonora do grupo Ojos Del Cielo que soma-se ao trabalho, bem como a iluminação pontuada.

O ponto alto do espetáculo é a interpretação dos atores. Destaco o naipe feminino, muito bem trabalhado nos seus respectivos universos. A atriz Carla Moscatelli é brilhante. Com uma voz majestosa, surpreende a todo momento. A personagem ajuda o seu desempenho, pois é o fio condutor de todas as ambigüidades desta família.

Enfim, ter a oportunidade de ver um Cocteau em nossa capital é um privilégio que só o Festival proporciona. Certamente, devemos aproveitá-la .

Ah! Aquela família do início saiu bem quietinha do teatro.

Paulo Guerra